Wednesday, January 04, 2006

Livros

Antes que você pense, eu vou dizer. “Esse texto é mais um daqueles”. “Daqueles quais?” você pergunta. E eu insisto: “daqueles!”. Ainda assim você não confessa nada e suplica ”Daqueles, quais?!?”. E aqui há a dúvida. Quando chegamos nesse ponto, não posso afirmar se você realmente não me entendeu. Talvez só não queira admitir que sabe do que eu estou falando. De qualquer forma, não me parece que vai dizer nada. E talvez esteja com aquela cara de me explica logo que eu não estou entendendo. Calma. É simples. Você está numa livraria, por exemplo. Para cada livro que você olha há uma expressão. Se você já leu e gostou muito, retira da prateleira com cuidado. Demonstra respeito, talvez saudade, e sente certa intimidade e satisfação. Segura o livro lido com as duas mãos e diz: “Pô, esse livro aqui…” e acrescenta: “Pô…”. Mas se você nunca leu e começa a se interessar muito, há uma surpresa. Há um outro tipo de valorização, apesar do comentário ser parecido: “Pô…” e acrescenta: “Esse livro aqui…”. Contudo, pode ser que seja só um livro mesmo. Mais um “daqueles”. Talvez você até faça um comentário: “Ih, esse aqui é ‘daqueles’…” e o livro volta pra prateleira. Mas se esse texto é mais um daqueles, qual é o propósito de lê-lo ou escrevê-lo? A verdade é que cometi um pequeno equívoco, esse texto não é exatamente “mais um daqueles”. É ele na verdade, um texto que você ainda vai ler. É um livro que te chamou a atenção. Intrigante, talvez. Você o tira da prateleira, olha a contracapa, lê o título, inconscientemente avalia a brochura, lê uma página ao acaso, lê a contracapa de novo, observa o tamanho da letra, sente a qualidade do papel, observa de novo o maldito tamanho dessas letras pequenininhas, porque será que fazem as letras desse tamanho, deve ser de propósito pra gente ficar com dor de cabeça, lê mais outra página ao acaso, inconscientemente verifica se a cor da capa é agradável, segura com a mão direita e mantém a mão esquerda coçando o queixo. Nessa posição, você olha fixamente para o produto literário. Esquece que está na livraria. E pensa alto dizendo pra si mesmo:
– Pô… Esse livro aqui…
E alguém ouvindo, tradicionalmente pergunta:
– É bom?
Ao que você confirma:
– É sim. Esse aqui é daqueles.
E apesar de você saber que “daqueles” não é bem uma descrição, você sabe que não precisa dizer mais nada. Afinal, “daqueles” era só uma palavra que você usou para dizer que o livro era, enfim, como dizer? Daqueles.

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