Thursday, May 11, 2006

Divisórias de um banheiro

Num banheiro, o suor escorria-lhe o rosto. “Tem entrevista às três”. Do toalete vizinho, um desabafo:
- Huuuummmpppffff!!!
Resolveu comunicar-se.
- Ó, amigo! Tem papel aí?
Silêncio. Não deve ter ouvido. E agora? Sem papel, sem relógio e sem comunicação. Mas o pior de tudo era ainda não ter terminado. Decidiu tentar de novo:
- Ó, amigo! Tens papel, aí?
- Huuummmppppffff...
Mais silêncio. Subitamente, houve comunicação:
- Papel, é?
- É! Papel, tem aí?
- Ih, rapaz. Sabe que não tem?
- Como “não tem”? É um absurdo. Isso aqui é um banheiro.
- Toma.
- Que é isso?
- Caderno dois do jornal. Substitui, né?
- Puxa. Obrigado.
Barulho de papel. Aproveitou o restante pra enxugar a testa. Calor. Papel. Banheiro. Comunicação. O que era mesmo? A entrevista!
- Ó amigo! Tem horas, aí?
- São duas e meia.
- Duas e meia? Dá tempo. Tem que dar.
- Compromisso, é?
- Tô quase me atrasando.
- Eu estou de carro, posso te dar uma carona. Hoje é minha folga.
- Puxa. Obrigado.
- Podemos ir agora. Estou terminando.
Ao som de duas descargas barulhentas, os dois saíram de suas cabines e da proteção que tinham de ver um ao outro. Fitaram-se: um deles engravatado, barba feita, pasta na mão; o outro, adolescente, cabelo comprido e um brinco no nariz.
- Olha, não precisa de carona, não.
- Sim. Digo, não. Na verdade eu tinha mesmo o que fazer agora que já são... que horas são?
- Pois é.
E cada um foi pra cada lado.

1 comment:

HenriqueS said...

Eu quero muito comentar. Mas não sei como!

...and they lived happly ever after?!

Enfim, tu escreves muito bem.
Pronto, é isso!